domingo, 18 de maio de 2008

Fichamento de HOBSBAWM, Eric J. Capítulos IV, V, VI. In: A Era dos Impérios 1875-1914. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988. pp.125-232.

Os capítulos IV, V e VI, contidos na obra A Era dos Impérios, expõem o processo de democratização das nações européias, e juntamente com este de que forma o movimento operário organizou-se e gradativamente rumou para a formação de uma classe trabalhadora mais abrangente e de âmbito nacional, finalizando com a questão do nacionalismo pré-guerra mundial que pode ser apontado como uma conseqüência, ainda que indireta, destas duas dinâmicas.
Hobsbawm inicia o capítulo IV, A Política da Democracia, abordando os efeitos da Comuna de Paris, principalmente sobre as elites econômicas que observaram organizações emergirem de modos cada vez mais radicais e dispostas a lutarem por uma nova sociedade. Este por sua vez consiste no principal objetivo desta parte do texto analisado, dissertar sobre como a democratização fora aceita pelas elites, e de que forma as massas organizaram-se em prol desta conquista.
Primeiramente o autor explicita o que representou a ocorrência da Comuna e de posteriores insurreições, que mesmo não possuindo o raio de ação desta, provocaram o medo e a instabilidade em nível regional e até mesmo nacional, tal qual esta protagonizou. Basicamente estes acontecimentos significaram um “ataque” do país real sobre o país legal, a pobreza, o descaso e a falta de condições mínimas no que diz respeito ao trabalho manual assalariado impulsionaram a revolta de grupos por toda a Europa, assustando a elite econômica e política. O receio provocado por esta dinâmica, pouco a pouco se transformou em concessões.
Os direitos, ainda que de forma tímida, proporcionaram um ambiente favorável para transformações um pouco mais profundas. Comecemos pelo o que expressa o autor: Os políticos talvez se resignassem a profilaticamente estender o direito ao voto, enquanto ainda eram capazes de controlá-lo, e não alguma extrema esquerda. (HOBSBAWM, 1988,p.128).
E realmente o objetivo, conforme discorre o texto, fora conduzindo a risca por vários países, seja pelo enfraquecimento das assembléias eleitas pelo povo, como no caso da Inglaterra, seja pelas exigências excludentes para se ter direito ao voto, como no caso Alemão, a democracia certamente a esta altura ainda era algo fortemente recheado de empecilhos ao seu exercício.
Os mecanismos utilizados pelos governos ocupavam os mais diversos campos, além dos citados, outros tantos existiam, como a fraude no registro eleitoral, as exigências de propriedade para o escrutínio, e simplesmente a pura intimidação, exercida por patrões ou outras figuras que gozassem de algum poder. As ferramentas citadas, indubitavelmente retardaram o movimento democrático, contudo não o impediu, e de certa forma como ressalta o texto, fomentou a organização dos descontentes com a situação criada; a mobilização articulada em prol do conflito contra as camadas conservadoras consistiu no fruto deste baú de pólvora criado pelas elites, que segundo Hobsbawm ainda desfrutavam de excessivo descrédito em relação à capacidade política das massas.
Deste modo, notabilizou-se a proliferação dos partidos de massa por toda a Europa, o surgimento da imprensa popular contribuiu em larga escala para esta expansão. Contudo, o autor ressalta as dificuldades encontradas pelos trabalhadores, sobretudo os operários, em formularem uma pauta comum a todos, suficientemente forte para despertar o interesse dos mais variados tipos de “pobres”, dos quais a participação havia se tornado condição para a própria sobrevivência dos movimentos opositores. Esmiuçar tanto quanto for possível a forma como este processo se desencadeou é o que pretende expor o autor no capítulo seguinte.
O capítulo V, Trabalhadores do Mundo, descreve os problemas enfrentados pela classe operária para o fortalecimento de seus projetos, assim como na evolução de suas pretensões. A transformação do discurso operário em um discurso do trabalhador se tornou algo indispensável para ampliar o raio de ação do proletariado. Somado a esta mudança gradual de postura, o movimento igualmente necessitou direcionar o seu olhar para o campo.
A ineficácia da máquina democrática criou uma necessidade de uma representatividade superior a qual se havia conquistado. O distanciamento do anarquismo, e as dissidências entre os que objetivavam instaurar o projeto original de uma nova ordem social, e os que vislumbravam de modo crescente a possibilidade de obter uma voz real entre os governantes a fim de estabelecer as melhorias há muito sonhadas, conferia caráter explícito das modificações as quais o movimento proletário estava sofrendo.
A parte revisionista encarregou-se de enfrentar os desafios cruciais para a formação de um Partido realmente de massas. Inicialmente havia a necessidade de se estabelecer um projeto abrangente, tal plano deveria abordar as dificuldades em comum dos trabalhadores, fossem estes operários ou camponeses, feito isto cabia aos partidários o lide com problemáticas ainda mais complexas, como as classes intermediárias, estas constituídas por profissionais liberais de um lado, e de outro artesãos e pequenos comerciantes, formavam uma parte da sociedade distantes da ideologia operária.
O problema da pluralidade das classes de trabalhadores manuais fora “solucionado” pela via ideológica, o ideal mesmo sendo proletário por natureza, podia ser facilmente adaptado pelo camponês, quanto às camadas intermediárias, estas sim consistiam em sério problema aos partidos de massa, e a direita ciente deste campo certamente não ficaria estagnada, prontamente formulando estratagemas para reverterem então ao seu lado.
O esquema construído pela direita, e principalmente pela extrema direita, é discutido no capítulo VI, Bandeiras Desfraldadas: Nações e Nacionalismo. Os apelos nacionais e o simbolismo desenvolvido em torno deste projeto representavam a ação do estado no apaziguamento das tensões sociais. Novamente o governo se utilizara de mecanismos que objetivavam a manipulação as massas e a manutenção de sua ordem social.
O nacionalismo propagado até meados da primeira guerra mundial, possui como maior público alvo evidentemente as massas, as dissidentes e as intermediárias, o culto a bandeira, ao povo, a língua e a necessidade de se defender o país de ameaças iminentes serviram de pilares aos quais se sustentaram a unidade nacional e a contenção de possíveis conflitos internos.
A educação desempenhou papel fundamental neste projeto, por meio da mesma objetivou-se um esforço em prol de uma língua oficial, além de despontar como um eficiente serviço de propaganda governamental em larga escala. Não ocasionalmente o número de professores primários elevou-se de modo até então inédito em diversas nações européias.
A organização em torno do nacionalismo rapidamente atingiu os movimentos operários que mais uma vez testemunhavam a necessidade de um projeto amplo, como ressalta Hobsbawm:

Os movimentos da classe operária, ao apelar para seus eleitores em potencial, na base da identificação de classe, não tardaram a compreender isso, na extensão em que precisaram competir, como de hábito em regiões multinacionais, contra partidos que pedia a proletários e a socialistas em potencial que os apoiassem como tchecos, como poloneses ou como eslovenos. Daí a sua preocupação, tão logo tornaram-se movimentos de massas, com a “questão nacional”.
(HOBSBAWM,1988,p.205).

Todavia, a propaganda nacionalista fora executada com requintes de perfeição. Modo que angariou considerável número de adeptos pertencentes às massas.
Como conclui Hobsbawm, a primeira guerra mundial possuiu, sobretudo cidadãos lutando em favor de sua pátria, e não conquistadores como imprimia a cultura do imperialismo. As problemáticas sociais foram apaziguadas temporariamente em torno de um interesse comum, este fato durou até meados de 1917, ano no qual a indisfarçável miséria e condição das massas englobou qualquer espécie de nacionalismo, conferindo mais uma vez força total as reivindicações e projetos em prol das maiorias.

Fichamento de POLANYI, Karl. A Grande Transformação. São Paulo, Campus, 1980. Capítulo 12. (Texto 8).

O autor Karl Polanyi propõe em seu texto, O nascimento do credo liberal, presente na obra A Grande Transformação, discutir os fatores que conduziram o estabelecimento do liberalismo econômico, assim como sua diferenciação do laissez-faire, explicitando as alterações implantadas para que seus preceitos fossem adotados, além de debater dificuldades encontradas por este sistema, juntamente com a desmistificação dos argumentos utilizados pela corrente liberal a fim de justificar o seu fracasso no período estudado.
Polanyi inicialmente registra que somente em 1820 é possível considerar que o laissez-faire está ligado a questão do livre comércio, antes deste momento o ideal presente nesta dinâmica restringia-se a flexibilizar as formas de produção. A partir da década seguinte o liberalismo econômico e o conceito de livre comércio ganham status de crença, e todos os problemas a princípios se tornam passíveis de solução com o advento deste sistema.
O comércio livre internacional começa a obedecer a uma lógica do não protecionismo, do mercado de trabalho e do padrão ouro. Diante desta tríade, o liberalismo econômico e o laissez-faire despontam como itens fortemente distintos. Enquanto o primeiro necessitou de uma ampla legislação para que fosse adotado, como no caso da Inglaterra que praticamente esfacelou sua agricultura, ao enfraquecer o protecionismo circundante desta, e adotou uma série de leis para que se criassem condições para o advento liberal, o último cada vez mais se mostrara utópico, um comércio e uma produção totalmente desprovidos da ação do estado notabilizaram-se como algo inviável.
Diante da diferenciação dos conceitos abordados, o autor propõe a abordagem de autores liberais, como Spencer e Summer, Mises e Lippann,que consideravam o laissez-faire e seu respectivo desenvolvimento naturais; e a intervenção por meio de leis regulamentares um ato de precipitação e crucial para os resultados negativos até então constatados por este sistema. Polanyi discorda deste entendimento afirmando que em meio a uma ideologia utópica e a notória constatação de sua inaplicabilidade por parte dos governantes, uma legislação realista formou as adaptações e reparos necessários para que a sociedade pudesse reagir as estragos já provocados e que se evitassem danos ainda maiores.
Somados a esta noção de precipitação, uma corrente liberal defendia a existência de um movimento coletivista responsável pelo surgimento de uma série de leis anti-laissez-faire, como o autor afirma em seu texto:

Focalizemos o assunto. Concorda-se que o movimento liberal, preocupado em difundir o sistema de mercado, foi enfrentado por um contramovimento protetor que se empenhava em restringi-lo. Esse pressuposto está de fato implícito em nossa tese do duplo movimento. Enquanto afirmamos, porém, que o absurdo inerente à idéia de um sistema de mercado auto-regulável teria destruído uma grande iniciativa. Incapaz de acrescentar a prova de qualquer esforço conjunto para dissolver o movimento liberal, ele recai na hipótese praticamente irrefutável da ação oculta. (POLANYI,1980,P.149).

O argumento de uma ação oculta, conforme o texto é inviável, considerando-se a formação de um compêndio muito similar de leis em várias nações européias, a demanda por uma organização em escala européia dificilmente ira conferir caráter oculto a esta possível corrente. Logo o que se torna nítido é que a legislação procedente de tal período respondia aos problemas diretos de cada Estado europeu, e não há uma conspiração extremamente eficiente e completamente improvável.